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Apicultura: trabalhos cooperativos no sertão piauiense

caixa de abelha com enxame- foto Wanantha Borges

O semiárido brasileiro é conhecido por sua grande diversidade, práticas culturais e identidade do seu povo, trazendo como principal patrimônio a Caatinga, um bioma natural e exclusivamente brasileiro. E dentro desse contexto, surgem os meios de sobrevivência para população, onde desenvolvem trabalhos cooperativos, como forma de convivência.
Na localidade Serra da Baraúna zona rural de Pio IX, apicultores realizam esse trabalho por meio da Cooperativa Mista Agropecuária de Pequenos Produtores (COOPIX). Dentro da associação atuam com a apicultura, com a extração do mel orgânico que é vendido pra Casa Apis.
As primeiras práticas realizadas pela COOPIX começaram em 1994, porém sua sede própria só foi construída em 1999. Segundo um dos fundadores, Manoel Augusto de Sousa, 54 anos, a construção da sede foi possível pela ajuda de projetos realizados por instituições como a Igreja Católica, o sindicato e os cooperados que na época construíram a casa. Ainda de acordo com Manoel Augusto, naquela época a agricultura familiar predominava na região e tinham dificuldades por conta do acesso à terra para produção.

primeiro presidente da Coopix Manoel Augusto- foto Luana Pereira

“Todo mundo era pequeno agricultor e a maioria não tinha terra, uns trabalhavam na terra dos pais, uns eram arrendatários, outros meeiros, e por sinal, a gente foi fazer um cadastro no Banco do Nordeste, e no primeiro momento a gente foi barrado porque ninguém tinha terra”, afirma.
Conforme o tempo ia passado, após receberem muitos nãos, os sócios conseguiram apoio do Banco do Nordeste para começar a industrialização o mel produzido no município, Manoel Augusto recorda que a partir da mudança de governo em 2004, mais oportunidades surgiram para as cooperativas, os sindicatos e vários movimentos populares.

 

Avanços e desafios
Com a indústria, a cooperativa começou a expandir a venda de produtos de mel industrializado, mel composto e alguns tipos de remédios que utilizavam mel. No entanto, um problema interno com o setor de contabilidade da cooperativa ocasionou uma dívida de 100 mil reais e levou os cooperados para estaca zero “A gente penou muito quando começou com a história da indústria, porque, como a gente não tinha ninguém com capacidade nessa história de contabilidade, isso é importantíssimo em todos os setores, a gente tem pagado alto por isso, porque o que a gente ganhou na cooperativa, nós tivemos que devolver esse dinheiro praticamente todo para o governo” afirma Manoel Augusto.
O apicultor Geraldo Francisco da silva de 47 anos, conta que começou a trabalhar nesse ramo com o pai, foi gostando, achando bonito e enxergou como uma renda, além da agricultura. Depois adquiriu colmeias que serviram de incentivo para começar.

Apicultor Geraldo Francisco-foto Maria Hilda

“Quando foi de 1996 pra 1997 surgiu uma dívida na cooperativa, começaram os problemas. Depois de assumir a presidência da cooperativa por dois mandatos, nesse período a gente passou a tirar dinheiro do bolso. Devido essa dívida perdemos o CIF da empresa e não podíamos mais industrializar’, lembra.

Tanto Manoel como Geraldo e os demais apicultores passaram por momentos difíceis, levar uma cooperativa com dividas, sem saber aonde iria dar. Muitos desistiram, preferiram abandonar, achando que não conseguiriam reverter a história.
Novos tempos
Já se passaram quase duas décadas e muita coisa mudou, chegaram sócios novos, surgiram outras oportunidades e assim o grupo segue com muitas experiências na bagagem. A dívida quase quitada, segundo o atual presidente José Francisco de Sousa de 33 anos, outro contador está tomando conta desses quesitos.
De acordo com José Francisco, atualmente, o grupo conta com 26 associados, sendo que a maior parte da renda mensal se dá por meio da apicultura. O presidente ainda destaca que é possível sobreviver apenas da prática da apicultura, porém é preciso ter conhecimentos sobre as técnicas de extração, além da dedicação.
A entidade passou a contar com cursos de capacitação e treinamentos especializados para todos os associados, disponibilizados pelo Sebrae, que é parceiro da cooperativa nessa área. O sócio Tomé Francisco da Silva, de 33 anos, relata sobre a oportunidade de conhecimento que esses cursos profissionalizantes proporcionam para melhoria das

Sócio Tomé Francisco-foto Jackelany costa

atividades.
“Passei 15 dias estudando com o pessoal da Fundação Banco do Brasil e 15 dias com o Sebrae. Nesse contexto, eu fui não querendo, vamos dizer assim,  agarrar essa oportunidade de emprego, mas fui pela oportunidade de conhecimento, isso me motivou, trouxe vários conhecimentos na área de apicultor, o conhecimento que eu ganhei foi muito grande e enriquecedor”, ressalta.

Se espelhando nas abelhas…
Apesar das dificuldades enfrentadas durante a trajetória, Geraldo destaca que se sentiu estimulado a continuar na cooperativa até os dias atuais por admiração do trabalho coletivo realizado pelas abelhas.
“O que mim deu coragem para seguir em frente, foi a criação de abelhas que eu já tinha. Se eu desistisse ia ficar isolado trabalhando só, eu vi que a apicultura deve ser como as abelhas, é preciso trabalhar juntos, unidos. Então eu enxerguei que se abrisse mão, não estaria sendo corajoso como as abelhas. E esse foi o motivo pelo qual eu não quis desistir, pois trabalhar só não é certo, temos que trabalhar juntos para que possamos produzir mais”, ressalta.

Abelhas em uma folha de cajú-foto Maria Hilda

O presidente da cooperativa José Francisco, diz que aprendeu a gostar da apicultura através do seu pai “Desde quando eu nasci o meu pai já era apicultor, e então, eu cresci vendo ele trabalhar com a apicultura. Com isso, fui aprendendo e gostando daquela prática”, afirma.

Presidente José Francisco- foto Luana pereira

Por se tratar de uma cooperativa certificada, filiada à Casa Apis e registrada ao SESCOOP (Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo), o estatuto exige que reuniões sejam realizadas pelo grupo a cada três meses ou quando for necessário, além de uma vez por ano ordinariamente (sempre no mês de março).
A Casa do Mel
A construção da Casa do Mel foi realizada no ano de 2008, aconteceu por meio da Casa Apis, de Picos. Atualmente,  o espaço possibilita todo o manuseio do mel, após a colheita, toda equipe é responsável pelos cuidados exigidos para o devido funcionamento, entre máquinas e limpeza do local, além disso, a Casa do Mel conta com uma estrutura organizacional para atender as demandas.
Após sua chegada à região, todos os cooperados passaram por capacitação para manuseio dos equipamentos, são exigidas técnicas precisas para que o produto extraído seja de boa qualidade, pois existe fiscalização por parte de órgãos de apoio.

casa do mel onde os cooperados fazem a colheita-foto Wanantha Borges

Após passar por todo o processo mencionado, o mel extraído no local é comercializado para todo o Brasil e pra os países da Europa através da Casa Apis.
Segundo o presidente da cooperativa, a estrutura atende as demandas de todo o grupo e veio para somar dentro da COOPIX. “Tem sido o suficiente para atender o nosso grupo. A Casa do Mel com certeza nos ajudou bastante”, assegura.

 

Desafios com a estiagem
No ano de 2012 o tempo mudou e teve início a estiagem que durou mais de cinco anos, nesse período quase não choveu na região. As abelhas indo embora, a mata seca e as plantações não eram suficientes para sustentar as famílias dos agricultores.
Em 2013, não aguentando a situação, alguns apicultores tomaram a decisão de levar o pouco de abelha que havia restado desses anos difíceis para outros lugares. E assim começou o processo de migração, exercido pelos próprios apicultores, na tentativa de pelo menos salvar o que restou dos enxames. Foi então que o apicultor Geraldo Francisco saiu em busca de uma solução favorável para esse problema.
“[…]Quando foi em 2013 foi eu e outro companheiro daqui, levei pouca abelha porque na época não pegava mais enxames a seca estava grande mesmo, fui fazer uma experiência, ver se dava certo. Consegui tirar mel e vi que compensava. Ai não parei mais, vi que compensava e cada ano vem aumentando mais as abelhas”.
No período das estiagens muitos associados se desestimularam da cooperativa, mas serviu também como um incentivo aos que permaneceram, é através do fluxo de migração que ambos sobrevivem até hoje como a principal renda de subsistência para as famílias dos associados.

A migração ocorre principalmente para os Estados do Maranhão e Ceará. Dentro do Maranhão, Geraldo percorre as cidades de Governador Nunes Freire e depois leva pra Serra do Araripe no Crato, no estado do Ceará.
E assim os apicultores seguem, uns na migração buscando melhorias outros ainda tentam ficar em Pio IX, mas não desistem dessa atividade, por ser propensa ao clima da região, além disso, a mesma não causa danos à natureza e por meio apicultura são gerados lucros que trazem melhorias para a vida desses homens simples do sertão piauiense.

 

Reportagem feita pelos alunos do curso de Jornalismo da faculdade R.sá:

Maria Hilda, Luana Pereira, Wanantha Borges, Jackelany costa

 

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