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NA SUBIDA DO MORRO A TRANSFORMAÇÃO DA FÉ DE UM POVO

subida do morro-foto Maria Hilda

Aproximadamente 300 anos em Picos no bairro Ipueiras no dia 03 de maio, centenas de pessoas sobem o morro do Quebra-Pescoço ou morro da Santa Cruz, como também é conhecido. Essa tradição é em homenagem a um vaqueiro chamado Joaquim, que segundo a história, com seu cavalo em companhia de um cachorro, subiram no morro para pegar uma vaca, quando chegaram em cima, caíram e todos quebraram o pescoço, assim nasceu o nome morro do Quebra-Pescoço. Tempo depois, um padre na época pediu que colocassem uma cruz lá em cima e sugeriu que mudassem o nome Quebra-Pescoço para morro da Santa Cruz. Após alguns anos apareceram vândalos, e na época quebraram a cruz, que era de madeira forte. Mas houve um conserto, a população se organizou e colocou zinco e vidro no crucifixo para evitar que acontecesse de novo.

Francisco Agostinho de 74 anos-foto: Daniel Reis

Francisco Agostinho da luz, de 75 anos, morador do bairro conta a história narrada em poemas que ele mesmo cria e por conta de ser analfabeto a filha Francimeire luz transcreve. “[…] já faz mais de cem anos quando algo aconteceu tinha um pecuarista que atrás do boi correu o boi fora do rebanho que quase este perdeu […]”. E assim a história vai sendo passada de geração para geração, com os poemas feitos por Agostinho ele tira da mente algo incrível para ensinar os mais novos ou como ele mesmo fala “pra não deixar a história acabar”.

Logo cedo, no dia 03 de maio começam-se a ouvir os fogos de artifício às 6h da manhã, pessoas do bairro Ipueiras e regiões vizinhas sobem o morro. Senhores, senhoras, jovens, crianças, deficientes, pessoas pagando promessa, todos vem pelo mesmo motivo, a fé. Começa com a alvorada e depois a santa missa. Encontra-se durante o dia um pequeno comércio, com pessoas vendendo comida e imagens de santos para os romeiros. Escolhido pelos fiéis católicos o dia 14 de setembro é mais uma data que a comunidade local e vizinhas se reúnem para juntos celebrarem a solenidade da exaltação da santa cruz. É dia de oração, penitência e louvores. […] “No nosso bairro é tradição o povo subir o morro, pagar suas promessas, vão venerar aquela cruz e comove o coração”, (Agostinho, poesia sobre o morro do quebra pescoço ou morro da santa cruz).

Zé neguinho- foto:Daniel Reis

Antônio Francisco do Nascimento mais conhecido por Zé Neguinho reside na comunidade de Umari, com seus 55 anos de vida nos conta sobre sua experiência e dedicação ao morro da santa cruz ou quebra pescoço. ʺsou mecânico e Analfabeto moro aqui a muito tempo e nunca havia subido láʺ, afirma. Ele nos relata que sua primeira experiência com o morro e para dar inicio a obra foi algo sobrenatural ele havia de estar passando na hora da santa missa e sentiu-se atraído para subir.
A comunidade em geral estava reunida e também romeiros de perto e de longe que com fé e devoção vinham exaltar aquela cruz sacra. O Pároco da Paroquia São José Operário a qual esta comunidade faz parte na época era o atual prefeito Padre José Walmir de Lima. Em meio a seu sermão no alto do morro colocou a vontade que brotava do seu coração. ʺa dois anos atrás me prometeram a restauração dessa cruz e ainda hoje nada foi feitoʺ, destacou Francisco.
Seu Francisco nos revela que algo incomodava seu coração. “Logo quando comecei a descer aquele morro comentei com alguns moradores que faríamos aquela restauração e também iriamos fazer uma escadaria para o morro”, Zé neguinho nos relata que muitos dos que lhe incentivaram não se colocaram a serviço. A parte mais delicada era as verbas para começar, mas isso não o desanimou. Conta-nos que em meio a uma madrugada recebeu um revelação divina através de um sonho. “Acordei minha esposa e como sou analfabeto pedi para que ela escrevesse o meu sonho e Deus me deu cada detalhe, até a pedra fundamental da construção que é quatro troncos de carnaúbasʺ, pontuou Zé neguinho.
Seu Francisco é um homem dedicado ao serviço comunitário e religioso e logo após a revelação divina que nos retrata começou a pedir as famílias da comunidade que doassem um degrau para a construção da escadaria. “O seu Raimundo pai de Odovaldo foi quem iniciou nas contribuições, os vinte primeiros degraus foi a sua inteira disposição e pagou também a mão de obra para esta construção”, disse.
A primeira restauração da cruz, segundo Zé neguinho foi feita de madeira com vidro, uma capsula que protegeria dos vândalos que subia o morro para beber. Porém o tempo não ajudou, chuva e sol fizeram a madeira se consumir, construíram então uma redoma para proteção da cruz de zinco com vidro. Aonde levaria chuva e sol, E a cruz estaria protegida.

crucifixo reformado-foto:Maria Hilda

ʺo que mais me tocou nessa passagem de minha vida foi que um dia às doze horas subia juntamente com o vidreiro e ali avistei três jovens rumo ao cruzeiro, peço perdão a Deus porque logo maldei e achava que iriam fazer besteira, porém chegando lá encima dei de cara com os três jovens de joelho rezando ao pingo do meio dia e quando junto com o vidreiro terminei o serviço eles no chamaram para fazer uma oração por todos os jovens deste mundo inteiroʺ, pontuou. Ele ainda nos afirma que Deus tem proposito na sua vida que ainda não acabou e na vida de todos é uma questão de ser atraído e escutar o que ele tem a falar.
Segundo a entrevistada Ana Irenilda de Araújo de 53 anos e professora do Estado a realização da inauguração da escadaria foi um momento impar na vida da comunidade. Aconteceu na segunda quinzena de outubro de 2015 onde ao final da tarde foi feita uma pequena celebração e logo em seguida ocorreu a distribuição de lanches e presentes para todas as crianças que ali estavam, esse evento foi duplo em louvor a escadaria do morro e a todas crianças que a um ano se reuniam toda quinzena para a recitação do terço no sopé do morro em interseção do serviço. ʺessa espiritualidade começou no inicio do trabalho da construção da escada e conseguimos ver o céu se mover ao pedido de varias crianças e pessoas da comunidadeʺ, declara Ana Irenilda.

Inauguração da escada com as crianças da comunidade-Foto: arquivo pessoal

A professora deixa uma mensagem direcionada aos jovens e crianças de nossa geração “É necessário que conheçam cada vez mais e leve adiante essa tradição e mais ainda se empenhem em concretizar o sonho de fazer daquele local não só um espaço de lazer mas acima de tudo de devoção a santa cruz”, finalizou.
E assim os romeiros seguem com orações, muita fé, com a veneração a santa cruz. Seja nas poesias de Agostinho ou na tomada de atitude de Zé neguinho ou até por outras histórias narradas por moradores. Não importa, o que todos querem é de algum jeito mostra sua devoção no alto do morro louva e pedir.

Reportagem produzida pelos alunos do curso de Jornalismo da faculdade R.sá:

Maria Hilda e Daniel Reis

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